quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Milícias, arrastões e ataques de bandidos a carros no Rio. Segundo especialistas, Estado perde espaço...





Arrastões e ataques de bandidos a carros no Rio exigem resposta forte, dizem especialistas





Van é destruída pelas chamas em Irajá: os 15 passageiros foram obrigados a desembarcar (Reprodução de TV)

RIO, 22/11/2010 - A polícia do Rio está diante da mais forte reação do crime organizado à política de segurança que acabou com o tráfico armado nas favelas pacificadas. De sábado até segunda-feira, houve na Região Metropolitana uma série de arrastões - em especial na Zona Sul e em áreas de grande visibilidade, como a Linha Vermelha - e ataques em que veículos foram incendiados. Os episódios acontecem a menos de um mês de a primeira Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) do estado, no Morro Dona Marta, em Botafogo, completar dois anos. Para especialistas e representantes de entidades do estado, os bandidos estão agindo dessa forma para aterrorizar a população e reagir à implantação das UPPs, que, à medida que avançam, controlam territórios antes dominados por traficantes.

Os especialistas acreditam que, apesar de terem sido recorrentes nos últimos dias, esses episódios são atos isolados. Mas requerem uma resposta contundente do poder público.

"O objetivo é aterrorizar as pessoas", diz antropóloga

A antropóloga Alba Zaluar observa que o aspecto positivo é o fato de ficar claro que a atual política de segurança está incomodando, dando prejuízo às facções criminosas.

- É óbvio que o projeto (das UPPs) tem que continuar. Só que o cobertor é curto. Os bandidos querem obrigar o governo a diminuir o efetivo nas favelas para combater os arrastões nas ruas. Eles querem criar um dilema insolúvel, mas há uma solução, que é não só aumentar o efetivo, mas também optar por ações mais bem estudadas e estratégicas - diz, acrescentando que as próximas UPPs devem priorizar o subúrbio, onde fica a maioria das favelas ainda dominadas por traficantes. - Se observarmos, os ataques se concentram nas áreas onde moram ou por onde passam os mais ricos da cidade. O objetivo é aterrorizar as pessoas.

Além da perda de territórios retomados pelo estado, o tráfico, diz o sociólogo Cláudio Beato, também está perdendo espaço para as milícias.

- Por um lado, está chegando ao fim o período de domínio violento do tráfico nas favelas. Por outro, há o crescimento e a estruturação das milícias - afirmou Beato, diretor do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), observando que as últimas ações são uma estratégia burra de chamar a atenção da sociedade. - Praticamente (os traficantes) estão convocando as autoridades para uma reação.

Para enfrentar a situação, ele defende que o estado invista mais em inteligência e análise criminal:

- O Rio analisa os índices criminais, visando a premiação e cumprimento de metas. Deveria analisar para compreender a movimentação da mancha criminal e agir preventivamente.

Para o coordenador do Núcleo de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense, professor Eurico de Lima Figueiredo, faltou planejamento para a implantação dos programas do governo:

- A intenção é afrontar, levar pânico à população. Eles agem com selvageria, numa violência desproporcional ao objetivo que querem alcançar. De qualquer maneira, são ações isoladas, desorganizadas. Se esses ataques resultam de uma transferência das atividades criminais do tráfico e da milícia para as áreas urbanas, se for isso, então significa que precisamos de forma sistêmica de policiamento que incorpore recursos humanos e materiais capazes de garantir a segurança pública, ao mesmo tempo que o governo implanta suas UPPs.

Eurico frisou que ataques em vias expressas podem ser evitados. Ele disse que as linhas Amarela e Vermelha têm poucas entradas e saídas, o que dificulta a fuga dos criminosos.

Já Expedito Carlos Stephani Bastos, pesquisador de assuntos militares da Universidade Federal de Juiz de Fora, disse que as ações lembraram os ataques a delegacias e prédios públicos de São Paulo, por grupos isolados. Para ele, faltou visão das autoridades.

- Não adianta fazer UPPs se essas áreas não forem inseridas na vida normal da cidade. Também é preciso reestruturar a polícia, investindo muito em inteligência. Hoje, a polícia só sabe (das ações de bandidos) depois.

O sociólogo Michel Misse acredita que os bandidos queiram usar a mídia para causar insegurança:

- A ideia é usar a mídia para assustar a população e amplificar o problema. O que está acontecendo é uma reação como já houve no Sul da Itália, no México e na Colômbia. É uma reação a uma política de segurança que está ocupando áreas antes controladas por organizações criminosas.

ABIH sugere pedido de reforço ao Exército

Para o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Rio (ABIH- RJ), Alfredo Lopes, diante da gravidade da situação, o governo do estado deveria pedir reforços ao Exército ou à Força Nacional:

- A repercussão é muito ruim porque as pessoas ficam com medo de vir para a cidade. Quem conhece o Rio sabe que se trata de uma reação à política de ocupação das comunidades, que vem sendo bem executada pelo governo. Mas os turistas não querem saber disso. É para que a população pense: todos os PMs estão nas UPPs e o resto da cidade está abandonado. É hora de o governo pedir ajuda.

Para o presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio (Firjan), Eduardo Eugenio Gouvêa Vieira, quem vive no Rio sabe que o momento é de batalha. Ele compara a guerra da polícia do Rio com os traficantes à luta travada pela Itália no combate à máfia.

- Estamos vivendo um panorama parecido. O governo, por meio das UPPs, tomou de volta territórios que estavam nas mãos de grupos criminosos. Agora, eles tentam uma reação. É preciso ter perseverança. A polícia não pode desistir - diz Eduardo Eugenio.

Publicada em 22/11/2010 às 23h40m

Carla Rocha, Elenilce Bottari e Simone Candida



Fonte: Globonline



Nenhum comentário: